Nêrilda Lourenço
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003 - "Os Bens de São Francisco: Fé e Devoção em Canindé"
O sol começava a descer no horizonte quando Frei Mathias de Ponteranica caminhava lentamente pelos corredores do convento, com os olhos contemplando as janelas iluminadas pelos últimos raios de luz. Era um homem devotado à sua missão, admirado por sua dedicação e zelo no cuidado com o patrimônio de São Francisco das Chagas de Canindé. Sob sua supervisão, o santuário havia se expandido, se tornado mais que um lugar de devoção, um símbolo da fé que transformava a vida dos fiéis e da comunidade ao redor.

O convento e o colégio, construídos com uma arquitetura imponente, eram os tesouros visíveis do santo, mas Frei Mathias sabia que o verdadeiro tesouro estava na espiritualidade que aqueles muros abrigavam. A cada ano, as romarias traziam centenas de devotos, pobres e ricos, jovens e velhos, que vinham em busca das bênçãos do santo milagroso. E o patrimônio de São Francisco crescia, com terras, gados e doações que os romeiros deixavam como forma de agradecimento.

Havia algo de sagrado no ar daquele lugar. As terras doadas pelos antigos proprietários, como a antiga Fazenda Renguengue, haviam sido fruto de promessas e milagres. As lendas sobre os senhores que resistiram à doação e depois adoeceram ecoavam entre os fiéis, reforçando a ideia de que ninguém podia se opor à vontade do santo. Frei Mathias conhecia essas histórias desde que chegou à vila, e seu coração pulsava forte ao lembrar dos tantos milagres atribuídos a São Francisco.

Uma tarde, enquanto caminhava pelos vastos salões do colégio, ele encontrou um dos órfãos, Joãozinho, sentado à beira da cisterna. O menino, que perdera os pais durante uma seca devastadora, havia sido acolhido pelo colégio e, desde então, mostrava uma curiosidade incansável sobre a história do santuário.

— Frei Mathias, o senhor pode me contar mais sobre as terras do santo? — perguntou o menino com olhos brilhantes.

O frade sorriu e se sentou ao lado de Joãozinho, olhando para a paisagem vasta que se estendia diante deles. Com paciência, começou a narrar como o patrimônio de São Francisco não se limitava aos bens materiais, mas era o reflexo da fé daqueles que vinham de todas as partes para agradecer pelas graças recebidas.

— Cada pedaço de terra, cada ex-voto, cada doação feita ao santuário, é uma prova viva da fé, meu filho. São Francisco nunca precisou de riquezas, mas as pessoas oferecem o que têm de melhor, como forma de mostrar sua gratidão. — Ele fez uma pausa, como se as palavras tomassem forma no vento. — O santuário é mais que tijolos, é um símbolo de esperança.

Os dias passavam, e a devoção não cessava. Peregrinos continuavam a chegar, trazendo suas orações e promessas. As esmolas eram cuidadosamente administradas pelos frades, que usavam os recursos para manter o colégio, o convento, a igreja e ajudar a comunidade local. Frei Mathias, sempre vigilante, se preocupava em manter o patrimônio em bom estado, sem ostentação, mas com a dignidade que o santo merecia.

Aos poucos, o colégio crescia, recebendo mais órfãos e pensionistas, oferecendo-lhes educação civil e religiosa. No teatro improvisado dentro do vasto prédio, os alunos ensaiavam peças que falavam sobre o amor e a caridade de São Francisco, e Frei Mathias sentia que o legado do santo continuava vivo em cada um daqueles meninos e meninas.

Uma noite, após as orações, ele se retirou para sua modesta cela e refletiu sobre sua missão. Estava consciente de que sua responsabilidade não era apenas material, mas espiritual. Ele, assim como os antigos administradores do patrimônio, era apenas um guardião temporário de algo muito maior. São Francisco continuaria a proteger Canindé, seus romeiros e devotos, mesmo muito depois que os frades de sua geração não estivessem mais ali.

O sino da igreja soou no silêncio da madrugada, e Frei Mathias sorriu, ciente de que o trabalho estava longe de terminar. A missão de espalhar a palavra do santo e cuidar dos que mais precisavam era eterna. O vento suave atravessava as janelas do convento, como se São Francisco, de algum lugar, estivesse abençoando sua obra e seus devotos.
Nêrilda Lourenço
Enviado por Nêrilda Lourenço em 10/09/2024
Alterado em 10/09/2024
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